Relator de orçamento e mãe de ministro apoiaram mais de R$ 867 milhões em emendas

Florys Arutzman
Florys Arutzman

O relator-geral do Orçamento de 2021, senador Márcio Bittar (União Brasil-AC), e a mãe do atual ministro-chefe da Casa Civil, senadora Eliane Nogueira (PP-PI), apoiaram emendas de relator que somam mais de R$ 867 milhões, apontam documentos dos parlamentares enviados à Presidência do Congresso e ao Supremo Tribunal Federal (STF).

As emendas de relator, conhecidas pelo código técnico RP9, foram apelidadas de “orçamento secreto” pelos opositores ao governo do presidente Jair Bolsonaro (PL) devido à suposta falta de transparência sobre a origem da indicação dos recursos e os políticos beneficiados, além dos critérios para a destinação dos valores.

Só no Senado, 64 senadores enviaram ofícios ao STF. Desses, 16 disseram que não fizeram nenhuma indicação, 35 detalharam os valores que indicaram nessa rubrica e 13 só disseram ter indicado, mas não informaram o quanto. Desta maneira, foram ao menos R$ 3,65 bilhões de recursos públicos destinados pelo governo às emendas desses parlamentares.

Críticos a Bolsonaro suspeitam que as emendas de relator sejam usadas como moeda de troca entre o governo e o Centrão –grupo informal composto por partidos sem tanta ideologia e que costuma se alinhar ao grupo que estiver no poder– para o andamento de votações no Congresso.

O senador Márcio Bittar afirmou, em ofício enviado ao presidente do Congresso Nacional e do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), ter apoiado 11 emendas de relator, com valor total de R$ 468,2 milhões.

Do montante, R$ 7,9 milhões foram apoiados em emendas de relator relativas a 2020 –R$ 7 bilhões para o “desenvolvimento e fortalecimento da economia criativa” por meio do Ministério do Turismo e R$ 965 mil para o “apoio a projetos de desenvolvimento sustentável local integrado” por meio do Ministério do Desenvolvimento Regional.

Relativo ao ano passado, os valores desse tipo de emenda que apoiou somaram R$ 460,2 milhões. A maioria dos recursos foi destinada a ações da pasta do Desenvolvimento Regional –R$ 294,8 bilhões– enquanto o restante foi destinado aos ministérios da Defesa, Saúde e Agricultura. O gabinete do parlamentar foi procurado, mas ainda não se manifestou.

Mãe do ministro-chefe da Casa Civil, Ciro Nogueira (PP), Eliane Nogueira apoiou R$ 399,2 milhões em 14 emendas de relator apenas em relação ao ano passado, informou. Ela disse, em ofício a Pacheco, não ter informações relativas a 2020 a prestar, pois, na época, ainda não era senadora. Suplente do filho, Eliane assumiu o cargo de senadora quando ele se afastou do Senado para comandar a Casa Civil, no fim de julho de 2021.

As emendas de relator apoiadas por Eliane se concentraram em ações para o Ministério da Saúde e a Codevasf (Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e do Parnaíba), como obras de infraestrutura. O gabinete da parlamentar também foi procurado, mas ainda não se manifestou.

O senador Eduardo Gomes (PL-TO), líder do governo Bolsonaro no Congresso, apoiou, em relação aos orçamentos de 2020 e de 2021, R$ 243,3 milhões, entre obras, compra de veículos, construção e reformas de estruturas esportivas, para citar algumas ações.

Alguns dos órgãos beneficiados pelas emendas que apoiou são os ministérios da Defesa, da Cidadania, da Saúde, da Agricultura, do Desenvolvimento Regional, a Funasa (Fundação Nacional de Saúde) e a Codevasf.

O senador Fernando Bezerra Coelho (MDB-PE), ex-líder do governo Bolsonaro no Senado, também apoiou, no mesmo período, o total de R$ 256.540.974,06 em emendas parlamentares.

Alguns senadores, porém, informaram não ter apoiado emendas de relator relativas aos anos de 2020 e 2021, como o filho mais velho do presidente Jair Bolsonaro, senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ).

Senadores governistas não foram os únicos que declararam ter apoiado emendas de relator nos últimos dois anos.

O senador Fabiano Contarato (PT-ES), por exemplo, à época na Rede, apoiou emendas de relator no valor total de R$ 20 milhões relativas ao orçamento de 2020, disse. Deste montante, R$ 1 milhão para um hospital universitário em seu estado eleitoral não chegou a ser empenhado, porque a instituição não teria tido tempo suficiente para terminar a registrar a proposta no sistema devido, contou.

Rodrigo Pacheco informou não ter apoiado emendas de relator em relação a 2020. Quanto a 2021, informou ter apoiado cerca de R$ 180,5 milhões nessa modalidade. Em nota à imprensa, Pacheco disse que, “objetivamente, o critério foi a análise das demandas dos municípios”.

“Apoiei essas indicações do relator, em 2021, porque os 853 municípios de Minas Gerais são uma síntese do Brasil, com carências em várias áreas e realmente necessitam. Com relação ao montante, em 2020 não fiz apoiamentos. Já em 2021, alguns apoiamentos puderam ser atendidos, outros não.”

68% dos parlamentares enviaram dados
Nesta segunda (9), após o STF determinar maior transparência às emendas de relator, o Congresso Nacional afirmou que 68% dos parlamentares enviaram informações detalhadas de recursos apoiados relacionados a esse tipo do orçamento.

Ao todo, 340 deputados federais e 64 senadores encaminharam ofícios com dados, como valores, obras financiadas e cidades beneficiadas. Os dados constam em documentos enviados pelos congressistas à Presidência do Congresso, que, por sua vez, encaminhou os arquivos ao STF.

O Congresso conta com 594 parlamentares –513 deputados e 81 senadores–, desconsiderados afastamentos e licenças. O pedido dos dados feito pela Presidência do Congresso aos parlamentares, após a determinação do STF, foi respondido por 340 deputados (66,27% da Câmara) e 64 senadores (79,01% do Senado), segundo o documento da Advocacia do Senado.

Portanto, 190 parlamentares não enviaram as informações, equivalente a 31,98% do Congresso.

Antes de pedir as informações sobre as emendas de relator para cada parlamentar, a Presidência do Congresso solicitou os dados para os relatores-gerais do orçamento dos últimos dois anos. Mas, eles afirmaram não ter as informações.

Dessa forma, Rodrigo Pacheco “oficiou diretamente a todos os deputados e senadores facultando a colaborar com o levantamento sobre apoiamentos de emendas RP9 que contaram com os seus respectivos apoiamentos nos exercícios financeiros de 2020 e 2021”.

A Presidência do Senado soltou nota nesta terça-feira (10) em que afirma que o Congresso fez “apenas o encaminhamento dos ofícios ao STF para conhecimento” e que “os parlamentares apontaram as emendas de relator que apoiaram”.

“O Congresso pode encaminhar novos documentos e elementos que entenda ser de interesse da ação judicial”, completou.

Em dezembro do ano passado, o Supremo fixou o prazo de 90 dias corridos para que o Congresso desse “ampla publicidade, em plataforma centralizada de acesso público, aos documentos encaminhados aos órgãos e entidades federais que embasaram as demandas e/ou resultaram na distribuição de recursos das emendas de relator-geral (RP9)” nos exercícios de 2020 e 2021.

Em março, o Congresso pediu outros 90 dias, mas teve o pedido negado pela ministra do Supremo Rosa Weber.

A Advocacia do Senado afirmou ao Supremo que o Congresso tem adotado medidas para assegurar transparência à execução das emendas, “apesar da inexistência de obrigação legal prévia para o registro documental das indicações”.

De acordo com o Senado, a Comissão Mista de Planos, Orçamentos Públicos e Fiscalização (CMO) do Congresso passou a adotar um sistema informatizado para registrar e dar maior transparência às indicações e à execução de programações oriundas de emendas de relator-geral.

O sistema é dividido em três módulos: recebimento de solicitações, indicações do relator-geral e acompanhamento da execução. Na solicitação, por exemplo, tornaram-se obrigatórios o registro do CNPJ do beneficiário, o valor do recurso a ser empregado, o objeto do gasto e a justificativa para utilização dos recursos.

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